O dia seis de junho de
2014 é uma data muito importante para Cícero Pereira Batista, 33. É data
da sua formatura, quando ele fez o"Juramento de Hipócrates" e jurou
fidelidade à medicina. O diploma na tão sonhada carreira foi um
investimento de quase oito anos da vida do ex-catador.
Natural de Taguatinga, cidade satélite a 22,8 km de Brasília, Cícero
nasceu em família pobre e precisou de muita perseverança para alcançar a
formação em uma das carreiras mais concorridas nos vestibulares. Ele só
começou a fazer a graduação aos 26 anos.
"Minha família era muito pobre. Já passei fome e pegava comida e livros
do lixo. Para ganhar algum dinheiro eu vigiava carro, vendia latinha.
Foi tudo muito difícil pra mim, mas chegar até aqui é uma sensação
incrível de alívio. Eu conseguir superar todas as minhas dificuldades. A
sensação é de que posso tudo! A educação mudou minha vida, me tirou da
miséria extrema", conta Cícero.
O histórico familiar de Cícero é complicado: órfão de pai desde os três
anos e com mãe alcoólatra, o médico tinha dez irmãos. Dois dos irmãos
foram assassinados.
Quando tinha 5 anos, o menino pegava o que podia ser útil no lixo.
Inclusive livros, apesar de não saber ler. Com o tempo, conta o
ex-catador, eles foram servindo de inspiração. Ficava mais feliz quando
encontrava títulos de biologia, ciências. Certa vez encontrou alguns
volumes da Enciclopédia Barsa e "descobriu Pedro Álvares Cabral, a
literatura, a geografia".
Cícero é o único da família que concluiu o ensino médio e a graduação.
Para ele, a educação era a única saída: "Diante da minha situação social
eu não tinha escolha. Era estudar ou estudar para conseguir sair da
miséria extrema". Ele terminou o ensino fundamental na escola pública em
1997 -- na época as séries iam do 1º ao 8º ano. Entre 1998 e 2001, fez o
ensino médio integrado com curso técnico em enfermagem.
Ajuda dos professores e colegas
"Quando eu fazia o ensino médio técnico eu morava em Taguatinga e
estudava na Ceilândia. Não tinha dinheiro para o transporte e nem para a
comida. Andava uns 20 km, 30 km a pé. Muitas vezes eu desmaiava de fome
na sala de aula", explica.
Ao perceber as dificuldades do rapaz, professores e colegas começaram a
organizar doações para Cícero de dinheiro, vale-transporte e mesmo
comida. "Eu era orgulhoso e nem sempre queria aceitar, mas, devido à
situação, não tinha jeito. Eu tinha muita vergonha, mas nunca deixei de
estudar", conta.
Na época da faculdade, Cícero também recebeu abrigo de um amigo quando
passou em medicina numa particular em 2006 em Araguari, a 391 km de
Brasília. "Frequentava as aulas durante a semana em Minas e aos finais
de semana vinha para Brasília para trabalhar. Era bem corrido", diz. Ele
conseguiu segurar as contas por um ano e meio. "Eu ganhava cerca de RS
1.300 e pagava RS 1.400 [de mensalidade]. Até cheguei a pedir o Fies
[Fundo de Financiamento Estudantil] por seis meses, mas no fim as contas
foram apertando ainda mais e parei".
Ao voltar para Brasília decidiu fazer Enem (Exame Nacional do Ensino
Médio) para conseguir uma bolsa do Prouni (Programa Universidade para
Todos). Estudou por conta própria, fez a prova no final de 2007 e
conseguiu uma bolsa integral em uma universidade particular de Paracatu
(MG), a 237,7 km de Brasília. Foram mais seis meses -- e Cicero voltou a
Brasília mais uma vez.
No ano seguinte, fez o Enem mais uma vez. Ele queria estudar mais perto
de casa por causa do trabalho -- ele era técnico de enfermagem
concursado -- e da família. Com sua nova nota do Enem, ele conseguiu uma
vaga com bolsa integral na Faciplac (Faculdades Integradas da União
Educacional do Planalto Central), na unidade localizada na cidade
satélite Gama, 34,6 km de Brasília.
"Tive que começar tudo zero novamente. Tive vontade de desistir na
época. Poxa, já tinha feito um total de dois anos do curso de medicina,
mas não consegui reaproveitar nenhuma matéria. Mas no fim deu certo",
conta o médico que enfrentou os anos da faculdade também com a ajuda dos
livros do projeto Açougue Cultural, uma iniciativa que empresta livros
gratuitamente nas paradas de ônibus de Brasília.
Atualmente, Cícero é diretor clínico de um hospital municipal e trabalha
em outros dois. O momento para ele agora é o de "capitalizar" [ganhar
dinheiro] para melhorar de vida e ajudar a família. Cursar um doutorado
fora do Brasil também está entre seus planos.
"Não há desculpa para seguir os sonhos. É preciso focar naquilo que se
quer. Não é uma questão de inteligência e sim de persistência. A
educação mudou a minha vida e pode mudar a de qualquer pessoa", conclui.
Do UOL
O dia seis de junho de 2014 é uma data muito importante para Cícero
Pereira Batista, 33. É data da sua formatura, quando ele fez o
"Juramento de Hipócrates" e jurou fidelidade à medicina. O diploma na tão sonhada carreira foi um investimento de quase oito anos da vida do ex-catador.
Natural de Taguatinga, cidade satélite a 22,8 km de Brasília, Cícero
nasceu em família pobre e precisou de muita perseverança para alcançar a
formação em uma das carreiras mais concorridas nos vestibulares. Ele só
começou a fazer a graduação aos 26 anos.
"Minha família era
muito pobre. Já passei fome e pegava comida e livros do lixo. Para
ganhar algum dinheiro eu vigiava carro, vendia latinha. Foi tudo muito
difícil pra mim, mas chegar até aqui é uma sensação incrível de alívio.
Eu conseguir superar todas as minhas dificuldades. A sensação é de que
posso tudo! A educação mudou minha vida, me tirou da miséria extrema",
conta Cícero.
Arquivo pessoal
Não há desculpa para não seguir os sonhos. É preciso focar naquilo que
se quer. Não é uma questão de inteligência e sim de persistência. A
educação mudou a minha vida e pode mudar a de qualquer pessoa Cícero Pereira Batista, 33, ex-catador que virou médico
O histórico familiar de Cícero é complicado: órfão de pai desde os três
anos e com mãe alcoólatra, o médico tinha dez irmãos. Dois dos irmãos
foram assassinados.
Quando tinha 5 anos, o menino pegava o que
podia ser útil no lixo. Inclusive livros, apesar de não saber ler. Com o
tempo, conta o ex-catador, eles foram servindo de inspiração. Ficava
mais feliz quando encontrava títulos de biologia, ciências. Certa vez
encontrou alguns volumes da Enciclopédia Barsa e "descobriu Pedro
Álvares Cabral, a literatura, a geografia".
Cícero é o único da
família que concluiu o ensino médio e a graduação. Para ele, a educação
era a única saída: "Diante da minha situação social eu não tinha
escolha. Era estudar ou estudar para conseguir sair da miséria extrema".
Ele terminou o ensino fundamental na escola pública em 1997 -- na época
as séries iam do 1º ao 8º ano. Entre 1998 e 2001, fez o ensino médio
integrado com curso técnico em enfermagem.
Ajuda dos professores e colegas
"Quando eu fazia o ensino médio técnico eu morava em Taguatinga e
estudava na Ceilândia. Não tinha dinheiro para o transporte e nem para a
comida. Andava uns 20 km, 30 km a pé. Muitas vezes eu desmaiava de fome
na sala de aula", explica.
Ao perceber as dificuldades do
rapaz, professores e colegas começaram a organizar doações para Cícero
de dinheiro, vale-transporte e mesmo comida. "Eu era orgulhoso e nem
sempre queria aceitar, mas, devido à situação, não tinha jeito. Eu tinha
muita vergonha, mas nunca deixei de estudar", conta.
Na época
da faculdade, Cícero também recebeu abrigo de um amigo quando passou em
medicina numa particular em 2006 em Araguari, a 391 km de Brasília.
"Frequentava as aulas durante a semana em Minas e aos finais de semana
vinha para Brasília para trabalhar. Era bem corrido", diz. Ele conseguiu
segurar as contas por um ano e meio. "Eu ganhava cerca de RS 1.300 e
pagava RS 1.400 [de mensalidade]. Até cheguei a pedir o Fies [Fundo de
Financiamento Estudantil] por seis meses, mas no fim as contas foram
apertando ainda mais e parei".
Arquivo pessoal A educação mudou minha vida, me tirou da miséria extrema Cícero Pereira Batista, 33, ex-catador que se formou em medicina
Ao voltar para Brasília decidiu fazer Enem (Exame Nacional do Ensino
Médio) para conseguir uma bolsa do Prouni (Programa Universidade para
Todos). Estudou por conta própria, fez a prova no final de 2007 e
conseguiu uma bolsa integral em uma universidade particular de Paracatu
(MG), a 237,7 km de Brasília. Foram mais seis meses -- e Cicero voltou a
Brasília mais uma vez.
No ano seguinte, fez o Enem mais uma
vez. Ele queria estudar mais perto de casa por causa do trabalho -- ele
era técnico de enfermagem concursado -- e da família. Com sua nova nota
do Enem, ele conseguiu uma vaga com bolsa integral na Faciplac
(Faculdades Integradas da União Educacional do Planalto Central), na
unidade localizada na cidade satélite Gama, 34,6 km de Brasília.
"Tive que começar tudo zero novamente. Tive vontade de desistir na
época. Poxa, já tinha feito um total de dois anos do curso de medicina,
mas não consegui reaproveitar nenhuma matéria. Mas no fim deu certo",
conta o médico que enfrentou os anos da faculdade também com a ajuda dos
livros do projeto Açougue Cultural, uma iniciativa que empresta livros
gratuitamente nas paradas de ônibus de Brasília.
Atualmente,
Cícero é diretor clínico de um hospital municipal e trabalha em outros
dois. O momento para ele agora é o de "capitalizar" [ganhar dinheiro]
para melhorar de vida e ajudar a família. Cursar um doutorado fora do
Brasil também está entre seus planos.
"Não há desculpa para
seguir os sonhos. É preciso focar naquilo que se quer. Não é uma questão
de inteligência e sim de persistência. A educação mudou a minha vida e
pode mudar a de qualquer pessoa", conclui. Do UOL
O dia seis de junho de
2014 é uma data muito importante para Cícero Pereira Batista, 33. É data
da sua formatura, quando ele fez o"Juramento de Hipócrates" e jurou
fidelidade à medicina. O diploma na tão sonhada carreira foi um
investimento de quase oito anos da vida do ex-catador.
Natural de Taguatinga, cidade satélite a 22,8 km de Brasília, Cícero
nasceu em família pobre e precisou de muita perseverança para alcançar a
formação em uma das carreiras mais concorridas nos vestibulares. Ele só
começou a fazer a graduação aos 26 anos.
"Minha família era muito pobre. Já passei fome e pegava comida e livros
do lixo. Para ganhar algum dinheiro eu vigiava carro, vendia latinha.
Foi tudo muito difícil pra mim, mas chegar até aqui é uma sensação
incrível de alívio. Eu conseguir superar todas as minhas dificuldades. A
sensação é de que posso tudo! A educação mudou minha vida, me tirou da
miséria extrema", conta Cícero.
O histórico familiar de Cícero é complicado: órfão de pai desde os três
anos e com mãe alcoólatra, o médico tinha dez irmãos. Dois dos irmãos
foram assassinados.
Quando tinha 5 anos, o menino pegava o que podia ser útil no lixo.
Inclusive livros, apesar de não saber ler. Com o tempo, conta o
ex-catador, eles foram servindo de inspiração. Ficava mais feliz quando
encontrava títulos de biologia, ciências. Certa vez encontrou alguns
volumes da Enciclopédia Barsa e "descobriu Pedro Álvares Cabral, a
literatura, a geografia".
Cícero é o único da família que concluiu o ensino médio e a graduação.
Para ele, a educação era a única saída: "Diante da minha situação social
eu não tinha escolha. Era estudar ou estudar para conseguir sair da
miséria extrema". Ele terminou o ensino fundamental na escola pública em
1997 -- na época as séries iam do 1º ao 8º ano. Entre 1998 e 2001, fez o
ensino médio integrado com curso técnico em enfermagem.
Ajuda dos professores e colegas
"Quando eu fazia o ensino médio técnico eu morava em Taguatinga e
estudava na Ceilândia. Não tinha dinheiro para o transporte e nem para a
comida. Andava uns 20 km, 30 km a pé. Muitas vezes eu desmaiava de fome
na sala de aula", explica.
Ao perceber as dificuldades do rapaz, professores e colegas começaram a
organizar doações para Cícero de dinheiro, vale-transporte e mesmo
comida. "Eu era orgulhoso e nem sempre queria aceitar, mas, devido à
situação, não tinha jeito. Eu tinha muita vergonha, mas nunca deixei de
estudar", conta.
Na época da faculdade, Cícero também recebeu abrigo de um amigo quando
passou em medicina numa particular em 2006 em Araguari, a 391 km de
Brasília. "Frequentava as aulas durante a semana em Minas e aos finais
de semana vinha para Brasília para trabalhar. Era bem corrido", diz. Ele
conseguiu segurar as contas por um ano e meio. "Eu ganhava cerca de RS
1.300 e pagava RS 1.400 [de mensalidade]. Até cheguei a pedir o Fies
[Fundo de Financiamento Estudantil] por seis meses, mas no fim as contas
foram apertando ainda mais e parei".
Ao voltar para Brasília decidiu fazer Enem (Exame Nacional do Ensino
Médio) para conseguir uma bolsa do Prouni (Programa Universidade para
Todos). Estudou por conta própria, fez a prova no final de 2007 e
conseguiu uma bolsa integral em uma universidade particular de Paracatu
(MG), a 237,7 km de Brasília. Foram mais seis meses -- e Cicero voltou a
Brasília mais uma vez.
No ano seguinte, fez o Enem mais uma vez. Ele queria estudar mais perto
de casa por causa do trabalho -- ele era técnico de enfermagem
concursado -- e da família. Com sua nova nota do Enem, ele conseguiu uma
vaga com bolsa integral na Faciplac (Faculdades Integradas da União
Educacional do Planalto Central), na unidade localizada na cidade
satélite Gama, 34,6 km de Brasília.
"Tive que começar tudo zero novamente. Tive vontade de desistir na
época. Poxa, já tinha feito um total de dois anos do curso de medicina,
mas não consegui reaproveitar nenhuma matéria. Mas no fim deu certo",
conta o médico que enfrentou os anos da faculdade também com a ajuda dos
livros do projeto Açougue Cultural, uma iniciativa que empresta livros
gratuitamente nas paradas de ônibus de Brasília.
Atualmente, Cícero é diretor clínico de um hospital municipal e trabalha
em outros dois. O momento para ele agora é o de "capitalizar" [ganhar
dinheiro] para melhorar de vida e ajudar a família. Cursar um doutorado
fora do Brasil também está entre seus planos.
"Não há desculpa para seguir os sonhos. É preciso focar naquilo que se
quer. Não é uma questão de inteligência e sim de persistência. A
educação mudou a minha vida e pode mudar a de qualquer pessoa", conclui.
Do UOL