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4 de jun. de 2014

Órgão que fiscaliza atividade no Brasil dificulta a vida de associações e cooperativas que oferecem modalidade de proteção a um custo em média 60% menor

Acidente após tentativa de roubo que custou R$ 15 mil ao capixaba Marcelo Salles, na região de Grande Vitória. Foto: Divulgação
Acidente após tentativa de roubo que custou R$ 15 mil ao capixaba Marcelo Salles, na região de Grande Vitória.
Foto: Divulgação
No fim de 2011, o capixaba Marcelo Salles* pretendia fazer um seguro contra roubo e colisão para sua Parati. Mas a cotação não saiu por menos de R$ 7 mil. Optou, então, por contratar uma espécie de proteção veicular oferecida por uma associação auto-denominada como clube de benefícios. A cobertura era semelhante à de seguradoras, a uma mensalidade de R$ 120.
No ano seguinte, Salles sofreu uma tentativa de roubo e teve o carro arrastado por 50 metros até bater contra o muro de uma casa, em Grande Vitória (ES). O ladrão fugiu e ele sofreu ferimentos leves. “Acionei a Union (União Nacional dos Proprietários de Veículos Automotores) para informar o sinistro e descobri que ela havia fechado e outra empresa assumiu seu lugar”, conta.
Após registrar o sinistro, Salles levou o carro a uma mecânica credenciada para fazer o reparo. Semanas se passaram até o orçamento ser aprovado, mas o serviço não era iniciado. A situação perdurou por seis meses, até o proprietário da Parati descobrir que a cooperativa devia R$ 65 mil para a oficina.
Salles decidiu negociar com o dono da mecânica e pagar o conserto do próprio bolso, que custou R$ 15 mil. Ele entrou com uma ação judicial contra a cooperativa, mas até agora não viu a cor do dinheiro. “É um esquema bem orquestrado. Retoques pequenos eles pagam, mas roubo ou perda total eles deixam acumular vários casos e depois desaparecem”, conta.
Empresas, associações ou cooperativas que vendem este tipo de proteção, especialmente veicular, estão cada vez mais na mira da Susep (Superintendência de Seguros Privados) – que regulamenta e fiscaliza o ramo de seguros no Brasil. O órgão tem punido mais as associações não autorizadas a vender o que chama de seguro pirata.
Em 2013, o número de empresas multadas por comercializar tais produtos mais que dobrou em relação a 2012, de 28 para 58. Quando o órgão começou a intensificar as investigações com base em denúncias de clientes e entidades, em 2011, foram aplicadas apenas 11 autuações.
Desde então, a Susep identificou pelo menos 300 entidades com atividades que considera ilegais. A maior parte está em Minas Gerais, segundo o órgão. No fim de janeiro, a autarquia havia multado 15 entidades em R$ 331 milhões. A  multa mais salgada foi a da Union – que deixou Salles na mão –, obrigada a pagar R$ 238,9 millhões.
Justiça já pediu o fechamento de 19 associações
O número de casos encaminhados ao Ministério Público para a abertura de ação judicial contra estes produtos saltou 48% em 2013, ante o ano anterior. Por outro lado, a quantidade de processos abertos para investigação não mudou muito entre 2011 e 2013: subiu de 81 para 83 casos, diferença de apenas 2,4%.
O Ministério Público também está atuante contra a atividade nos últimos anos. Em 2012, o órgão no Espírito Santo (MPF/ES) denunciou administradores de uma empresa e quatro associações por atuarem de forma ilegal como seguradoras, e pediu à Justiça a suspensão das atividades. No mesmo ano, a Justiça ordenou o fechamento de 19 associações pela prática.
Na contratação, a proteção veicular chega a custar em torno de um terço do preço de seguros comuns, mas pode ficar mais cara conforme o número de sinistros, à medida que o grupo de pessoas rateia o prejuízo com as ocorrências.
Atuação contra seguradoras pirata no Brasil
Algumas entidades oferecem a opção do que chamam de rateio presumido: como o valor da mensalidade pode aumentar com os eventuais sinistros, o participante opta por pagar um valor maior por mês para não precisar custear o rateio.
Uma das associações que comercializam a proteção veicular, a Fortcar, oferece aos clientes R$ 100 por cada indicação de conhecido ou amigo para participar do negócio.
Cliente não sabe diferenciar proteção de seguro comum
O especialista em seguros Julio Tenreiro, da Korsa Corretora, comenta que o consumidor nem sempre sabe diferenciar o seguro legal destas proteções. “Se o produto tem preço muito inferior ao do mercado, há duas possibilidades: ou tem cobertura inferior, ou pode não ser autorizado pela Susep”.
No site do órgão, é possível consultar se a empresa ou associação é autorizada a funcionar como seguradora. Geralmente, os grupos não autorizados evitam usar o nome ‘seguro’. Substituem por termos como proteção ou clube de benefícios, para não serem enquadradas como atividade ilegal.
Mesmo que estes grupos não mencionem a palavra, a Susep pode multar seus responsáveis caso a atividade se configure como tal, diz o advogado e especialista em seguros, Antonio Penteado Mendonça.
“Arrecadar fundos de um grupo de pessoas para cobrir eventuais danos a um bem protegido caracteriza seguro”, observa.
As seguradoras oficiais se valem de cálculos complexos para avaliar o risco de cada segurado – como local de moradia, sexo e idade – a fim de garantir uma reserva e assegurar a saúde financeira da operação.
Na análise de Tenreiro, as entidades que comercializam seguro pirata não possuem elementos técnicos para cobrar o preço adequado de um seguro – levando em conta o risco – deixando com o grupo a responsabilidade financeira pelo aumento dos sinistros.
“O maior risco para o consumidor é que essas cooperativas podem não formar uma reserva suficiente para cobrir todos os sinistros. Se isso ocorrer, elas podem não pagar”, completa Penteado Mendonça.
* O nome do personagem foi modificado para preservar sua identidade
Fonte: IG

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