Agindo em bando
e fortemente armados, criminosos adotaram táticas de guerrilha para
invadir pequenas cidades e saquear, simultaneamente, o dinheiro dos
caixas eletrônicos dos bancos com uso de explosivos. Chamado de "novo
cangaço", eles espalham o medo e transformam, da noite para o dia, a
vida nos municípios do interior de São Paulo e das divisas com Minas
Gerais e Paraná, considerados recantos de sossego.
Identificadas
desde 2011, as ações do novo cangaço se intensificaram desde o ano
passado, segundo o Departamento Estadual de Investigações Criminais
(Deic). O crescimento é atribuído à atuação organizada de três grandes
quadrilhas paulistas identificadas pelo órgão, com 20 a 30 membros cada.
Os novos cangaceiros agem de madrugada, com veículos potentes, em ações
que levam, em média, 15 minutos. Vestem touca ninja na cabeça, luvas e
coletes. As cidades menos populosas são escolhidas não só pelo baixo
efetivo policial, mas também pelo isolamento geográfico.
Recriando o
estilo dos velhos cangaceiros do sertão nordestino - em uma versão
moderna mais violenta e desprovida de motivações sociais -, os
criminosos sitiam a cidade com barricadas e contenção armada nos acessos
viários, disparam contra a base policial para impedir reações e contra
curiosos que possam identificá-los.
Enquanto isso, outra parte do grupo invade as agências e destroem os caixas com explosivo roubado de pedreiras e grandes obras.
"São criminosos
que encontraram dentro desse formato de agir um meio mais fácil de
roubar sem serem presos em flagrante ou identificados por testemunhas",
explica o delegado do Deic Ruy Ferraz Fontes. "Eles agem rápido, afastam
testemunhas com disparos a esmo e fogem antes de chegar reforço. É
difícil ter flagrante."
Por causa do
baixo lucro dos saques, a polícia identificou que as quadrilhas têm
atuado quase que semanalmente para se manter. Cidades como Santa Branca,
Conchas e Avaí, visitadas pelo Estado, foram alvo dos criminosos.
Estima-se que as explosões deram prejuízo de mais de R$ 70 milhões aos
bancos, no ano passado. Parte desse dinheiro abastece o Primeiro Comando
da Capital (PCC), segundo as investigações.
Medo de guerra.
A última ação do novo cangaço terminou em uma guerra entre polícia e
criminosos, no fim de semana passado, no sul de Minas. Por quase meia
hora, cerca de 200 policiais trocaram tiros com pelo menos 20 bandidos
em Itamonte. Dez criminosos foram mortos, um refém acabou assassinado
por engano, um comerciante foi sequestrado e depois solto e um policial
ficou gravemente ferido.
Por causa do
confronto, o prefeito Ari Constantino Filho (PP) cancelou o carnaval,
mesmo com palco montado na praça e artistas contratados. A dona de casa
Diva Maria Rodrigues, de 56 anos, que mora na mesma rua em que um banco
foi explodido, diz que "ninguém mais sai de casa depois que escurece".
"Ainda mais que disseram que tem bandido escondido por aí", diz.
"Pessoas que
vivem em lugares como esses, quando passam por um episódio traumático,
com confronto armado e mortes, têm a mesma sensação de quem está na
guerra", explica a professora de psicologia forense da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas Maria de Fátima Santos. "É natural
passarem a ver estranhos como suspeitos. É um mecanismo de defesa
natural."
A Federação
Nacional dos Bancos (Febraban) informou que acompanha "com extrema
preocupação" os ataques. O órgão afirmou, em nota, que os investimentos
em segurança dos bancos saltaram de R$ 3 bilhões, em 2002, para R$ 9
bilhões, no ano passado. Diante da força "desproporcional" aplicada
pelas quadrilhas, "a ação de segurança permitida pela legislação (aos
bancos) é insuficiente".
Segundo o
delegado Fontes, a polícia intensificou a ofensiva contra as quadrilhas,
com apoio do Exército, que fechou o cerco contra os roubos e desvios de
explosivos.
Ricardo Brandt
O Estado de S. Paulo
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